A Amazônia está cada vez mais urbana. Atualmente, as cidades abrigam 76% de toda a população da região. No entanto, apesar desse crescimento, as cidades amazônicas enfrentam desafios significativos em termos de qualidade de vida em comparação com as áreas urbanas do restante do Brasil. Questões como a escassez de saneamento básico, problemas de mobilidade urbana e a baixa cobertura de arborização urbana têm afetado as comunidades urbanas da região.
A urbanização recente na Amazônia Legal pode ser dividida em dois momentos distintos relacionados à integração da região ao restante do país. O primeiro momento remonta à época em que os rios desempenhavam um papel fundamental na economia local, especialmente na extração da borracha nativa, o que resultou no surgimento de uma rede urbana mais antiga a partir da segunda metade do século 19. O segundo momento, principalmente a partir dos anos 1970, testemunhou um rápido crescimento de várias cidades e vilas ao longo dos eixos rodoviários abertos pelo governo militar.
Esse crescimento acelerado das cidades ao longo das rodovias foi resultado de projetos de colonização agropecuária, exploração mineral e construção de hidrelétricas, como parte dos esforços de ocupação da Amazônia. Infelizmente, a expansão desordenada da fronteira amazônica resultou em uma distribuição irregular das cidades pelo território, com poucas cidades de médio porte e uma profusão de cidades menores.
Para produzir o relatório: “Cidades Amazônicas: um chamado à ação”, os pesquisadores Washington Fajardo, André Luiz Pinto, Tatiana Maia Lins e Victor Barone realizaram uma pesquisa qualitativa com os especialistas em temas urbanos na Amazônia, incluindo pesquisadores, arquitetos e urbanistas, gestores públicos, entre outros. No total, foram realizadas 68 entrevistas semiestruturadas , das quais 42 em maior profundidade, que totalizaram mais de 100 horas de trabalho e resultaram em uma Matriz de Materialidade. Essa matriz direciona os esforços para a solução dos desafios mais importantes nos âmbitos urbano, social e de governança.
A pesquisa identificou que a falta de uso adequado de instrumentos de planejamento também contribuiu para o crescimento desordenado das cidades amazônicas. A região tem se mostrado carente em termos de ferramentas de planejamento eficazes. De acordo com o Estatuto das Cidades, o Plano Diretor é o instrumento básico para a política de desenvolvimento e expansão urbana. No entanto, mais de duas décadas após a criação do Estatuto, apenas metade dos municípios da Amazônia Legal possui um Plano Diretor.
O desenvolvimento da Amazônia depende, em grande medida, da melhoria das condições de vida nas cidades, onde a grande maioria da população está concentrada. A melhoria da educação, do transporte público, da infraestrutura de internet de banda larga e da segurança pública são fatores essenciais para atrair e reter capital humano nas cidades. Além disso, princípios bioclimáticos adequados para as cidades da região devem ser considerados, especialmente diante das crescentes mudanças climáticas. A arborização urbana e a preservação das áreas de floresta remanescentes devem ser priorizadas em uma região caracterizada por seu clima quente e úmido. A hidrografia amazônica, muitas vezes negligenciada no planejamento urbano, também oferece oportunidades valiosas para o transporte, paisagismo e funções ecológicas nas zonas ribeirinhas das cidades.
A busca por uma urbanização mais sustentável na região está sendo impulsionada por um movimento crescente em prol do aprimoramento das cidades amazônicas. Esse movimento se manifesta por meio de iniciativas culturais, exposições, fóruns e congressos regionais, nacionais e internacionais sobre urbanismo. Esses encontros não apenas fortalecem o senso de identidade local, mas também permitem a interação e a troca de ideias entre especialistas, sociedade civil, gestores públicos e setor privado para enfrentar os desafios urbanos e encontrar soluções.
Dentre as ações sugeridas, destaca-se a proposta de realizar a “Bienal do Urbanismo para a Amazônia”. Essa iniciativa contribuiria para identificar e ampliar as boas práticas já realizadas por profissionais e instituições, tanto dentro quanto fora da Amazônia. Além disso, permitiria o intercâmbio com cidades de outros países amazônicos. A “Bienal do Urbanismo para a Amazônia” poderia ser realizada de forma alternada em diferentes cidades da região.