A conversão de áreas já desmatadas em sistemas produtivos sustentáveis pode gerar empregos verdes, ampliar a renda regional e reduzir a pressão sobre a floresta, aponta um novo estudo que revela que a Amazônia possui 35 milhões de hectares disponíveis para rematamento e hoje captura apenas 3% de um mercado global de US$ 233 bilhões em produtos da floresta. Assinado por Salo Coslovsky e Beto Veríssimo, o trabalho do projeto Amazônia 2030 detalha como essa estratégia pode reconciliar proteção ambiental e desenvolvimento econômico, propondo um programa nacional baseado em coordenação estatal, tecnologia e segurança fundiária.
A Notas de Políticas Públicas (Policy Brief), “Para proteger a floresta amazônica, precisamos rematar as áreas desmatadas”, apresenta uma proposta ampla e factível para enfrentar simultaneamente dois desafios históricos da região: a falta de oportunidades econômicas e a fragilidade da conservação ambiental. O estudo mostra que o rematamento produtivo, a recuperação de áreas já abertas e hoje subutilizadas por meio de sistemas agroflorestais, silvicultura e restauração, pode gerar empregos de qualidade, ampliar a renda dos amazônidas e reduzir o avanço de atividades ilegais que pressionam a floresta.
Entre as principais mensagens do documento estão:
- Rematar áreas degradadas é a chave para quebrar o impasse entre desenvolvimento e conservação.
- A Amazônia tem cerca de 35 milhões de hectares disponíveis para rematamento, sem necessidade de novo desmatamento.
- A região movimenta US$ 7,2 bilhões por ano com produtos compatíveis com a floresta, mas isso representa apenas 3% de um mercado total de US$ 233 bilhões.
- Sem empregos verdes, a proteção ambiental é frágil, e retrocessos recentes mostram que só conservar não é suficiente.
- Um programa nacional de rematamento produtivo pode gerar renda, capturar carbono, restaurar ecossistemas e fortalecer cadeias produtivas já consolidadas.
O estudo destaca que, entre 2013 e 2024, a Amazônia perdeu 4,6 milhões de hectares a mais de floresta do que teria perdido se o desmatamento tivesse permanecido no piso histórico de 2012. A criação de áreas protegidas estagnou e a grilagem de terras públicas voltou a crescer, enquanto legisladores federais e estaduais enfraqueceram mecanismos de proteção.
Esse cenário é agravado pela escassez de empregos e negócios verdes, que leva parte da população a depender de atividades predatórias como garimpo, grilagem e pecuária extensiva. Para os autores, não haverá conservação duradoura sem prosperidade local, e a saída está nas áreas já abertas.
Por que o rematamento produtivo funciona
O estudo demonstra que o rematamento produtivo reúne as condições necessárias para ser implementado em grande escala:
- Existe demanda real e crescente por produtos como açaí, cacau, banana, mandioca, fibras e palmáceas.
- A agricultura moderna se tornou intensiva em tecnologia, gerando empregos qualificados no campo e nas cidades.
- O mercado de restauração florestal e captura de carbono está em expansão, oferecendo novas fontes de renda.
- A Amazônia já tem empreendedores experientes nessas cadeias e exemplos concretos de sucesso.
- O país acumulou lições importantes sobre como desenhar políticas produtivas eficazes.
Os autores propõem um Programa Nacional de Rematamento Produtivo estruturado em cinco pilares:
- Resolver a questão fundiária, protegendo florestas públicas e regularizando áreas antigas de desmatamento.
- Ampliar o financiamento de longo prazo, usando contratos futuros, inclusive de carbono, como garantia.
- Desenvolver tecnologia e capacitação local, com foco em operações rurais tecnificadas e agroflorestais.
- Reorientar políticas de desenvolvimento produtivo para apoiar cadeias já consolidadas e competitivas.
- Coordenar a ação estatal, garantindo previsibilidade, escala e metas claras.
O Brasil tem condições de avançar rapidamente em um programa com impacto econômico, social e ambiental simultâneo. “O rematamento produtivo aumenta a produtividade, gera empregos verdes e fortalece a conservação. A Amazônia pode prosperar sem derrubar mais floresta, e o país precisa agir agora”, afirmam os pesquisadores.



