Os jovens e adolescentes que vivem na Amazônia Legal cursam o Ensino Médio fora da idade esperada — e evadem da escola com uma frequência maior do que a dos jovens no restante do Brasil. Na outra ponta, é mais comum que as pessoas na região busquem a Educação de Jovens e Adultos (EJA) para completar os estudos, e em etapas menos avançadas do que no resto do país. O quadro é reflexo de uma série de obstáculos, que incluem o número reduzido de vagas em escolas na zona rural, as altas taxas de analfabetismo e reprovação, e a desilusão do jovem em relação ao mercado de trabalho.
Os dados são parte de uma nova análise conduzida pelo projeto Amazônia 2030. No relatório “A Educação na Amazônia Legal – Diagnóstico e Pontos Críticos”, as economistas da educação Tássia Cruz (FGV EBAPE / CEIPE) e Juliana Portella (FGV EBAPE) traçam um panorama da educação básica e superior na região. Constatam que o cenário é marcado pelas baixas taxas de escolarização em praticamente toda a jornada educacional: da educação infantil ao ensino superior, o número de pessoas estudando na Amazônia é proporcionalmente menor do que o verificado no restante do país. A exceção fica a cargo do Ensino Fundamental, etapa em que as estatísticas da Amazônia são semelhantes as do restante do Brasil; e da Educação de Jovens e Adultos (EJA), em que a procura é maior na Amazônia que nas demais regiões.
As taxas de escolarização baixas são um problema para uma região com população jovem. Hoje, a Amazônia vive um fenômeno conhecido como “bônus demográfico”. Ele ocorre quando a população que trabalha e paga impostos é maior que o número de aposentados e crianças vivendo em uma região. Em condições ideais, o bônus demográfico contribui para a geração de riqueza e desenvolvimento. Ele é também um fenômeno transitório e único.
Segundo as autoras, a escolarização deficitária e a alta taxa de desemprego entre os jovens podem pôr a perder o bônus demográfico da Amazônia. “Diversos autores argumentam que os benefícios do bônus demográfico dependem fundamentalmente da oferta de uma educação acessível e de qualidade que seja capaz de qualificar a população em idade ativa para participar dos setores produtivos daquela economia”, afirma o estudo.
Para gerar desenvolvimento, acrescentam as autoras, é ainda preciso que essa educação de qualidade venha acompanhada por um mercado de trabalho dinâmico, capaz de oferecer bons empregos.
Faltam vagas para ensino médio na zona rural
Para entender o que acontece na Amazônia, as pesquisadoras recorreram a dados do Censo da Educação Básica, do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), e a dados populacionais do Instituto de Geografia e Estatística (IBGE), entre outras fontes.
Os números mostram que 72,6% dos jovens entre 15 e 17 anos que vivem na região estão matriculados no Ensino Médio. Essa estatística recebe o nome de “taxa de escolarização bruta”. Embora alta, ela é inferior para a Amazônia em comparação ao restante do país, onde 82,3% dos jovens cursam essa etapa de ensino.
Além disso, existe um descolamento entre a idade dos alunos e a etapa de ensino cursada. No caso do Ensino Médio, espera-se que eles tenham entre 15 e 17 anos. Na Amazônia Legal, 31,2% dos estudantes matriculados no Ensino Médio têm idade acima da esperada para o ano em que estão matriculados. Esta taxa é de 28,1% no resto do país.
Por fim, a evasão escolar durante o Ensino Médio na região é também superior à média nacional: 10,1% contra 9,2%.
Segundo as autoras, uma possível explicação para a evasão alta é a dificuldade de acesso aos estabelecimentos de ensino. Pouco mais de 23% da população da Amazônia vive na zona rural, mas somente 13,5% das vagas do Ensino Médio encontram-se nessas regiões.
A falta de engajamento dos jovens é também influenciada pelas perspectivas ruins do mercado de trabalho. Em 2019, 57% das pessoas entre 18 e 24 anos que viviam na região não tinham nenhuma ocupação. A falta de dinamismo do mercado, que é particularmente hostil à inserção de jovens trabalhadores, acaba por reprimir a demanda pela educação a partir do Ensino Médio, criando ainda mais obstáculos para que os jovens alcancem ocupações que lhes forneçam boas condições de vida.
Falta de vagas para a educação infantil
A baixa taxa de escolarização é verificada também entre as crianças da educação infantil, que abrange a creche (entre 0 e 3 anos) e a pré-escola (4 e 5 anos). Estudos anteriores já demonstraram que a educação infantil é importante para garantir que a criança receba estímulos adequados durante a primeira infância, uma fase fundamental para o desenvolvimento cognitivo. Na Amazônia, 51% das crianças entre 0 e 5 anos estão matriculadas na educação infantil — contra 66% no restante do país.
A situação é pior entre aquelas crianças em idade de frequentar creches: somente 25,6% das crianças entre 0 e 3 anos na Amazônia estão matriculadas em estabelecimentos de ensino. No Brasil, a média é de 44,8%. Há indícios de que esta é uma circunstância causada pela falta de oferta de vagas em creches em determinadas regiões. Segundo os resultados da PNAD Contínua de 2019, na região Norte, que compõe a maior parte do território da Amazônia Legal, 41,1% das famílias com crianças de 0 a 3 anos que não frequentavam a escola apontavam a falta de oferta como motivo principal. Nas demais regiões do país, a média foi de 29,4%.
Autores: Tássia Cruz e Juliana Portella
Digital Object Identifier (DOI): http://doi.org/10.59346/report.amazonia2030.202112.ed24