Três a cada quatro crianças que vivem nos estados da Amazônia Legal moram em cidades onde o investimento médio em educação, dividido pelo número de crianças e adolescentes em idade escolar, fica abaixo da média nacional. Não são municípios que gastam pouco: comparado ao seu Produto Interno Bruto (PIB), o gasto com
educação é alto. Mas é insuficiente para suprir as necessidades de uma população escolar jovem e numerosa. A falta de recursos adequados tem reflexos no desempenho dos estudantes: hoje, os estados da Amazônia Legal acumulam alguns dos piores resultados em avaliações nacionais.
A descoberta é da equipe do economista Carlos Eugênio da Costa, professor da Fundação Getúlio Vargas e pesquisador do projeto Amazônia 2030. O time de pesquisadores queria entender quais os reflexos das políticas fiscais adotadas na Amazônia para a qualidade de vida da população. “O objetivo da política fiscal deve
ser o de melhorar as condições de vida das pessoas”, diz da Costa. “Queríamos entender se as decisões tomadas no campo da educação tiveram efeito benéfico para quem vive na Amazônia”.
A questão é especialmente importante para a região. Lar de uma população jovem, a Amazônia alcança pontuações inferiores à média nacional no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB), um dos principais indicadores a avaliar a qualidade da educação básica no país.
Tradicionalmente, o investimento público em educação é medido por uma relação entre o valor aplicado e o PIB. O gasto, no caso da educação básica, fica a cargo de estados (para o ensino médio) e dos municípios (para o ensino fundamental). Por esse critério, a Amazônia vai bem: “Quando consideramos os gastos como proporção do PIB, tanto a nível estadual quanto municipal, os gestores da Amazônia Legal estão gastando mais em educação do que a média dos gestores das demais regiões do país”, escrevem os autores. Na Amazônia, os gestores estaduais e municipais aplicam, em média, 7,14% do PIB em educação. São mais de três pontos percentuais acima da média nacional, que gira em torno de 4,3%.
O tombo ocorre quando esse volume de recursos é dividido pela população em idade escolar, entre 0 e 19 anos. Por esse critério, a Amazônia fica para trás: os estados e municípios da região investiram, em 2019, R$4491,70 por aluno, contra os R$5.050,90 aplicados, em média, no restante do país.
Essa discrepância no nível de investimento tem reflexos na qualidade do serviço oferecido aos estudantes. No caso do ensino médio, por exemplo, os alunos da região têm menos horas de aula do que os estudantes do restante do país. A diferença pode chegar a uma hora de aula a menos, no caso do Mato Grosso. “É como se um aluno do Mato Grosso tivesse um dia a menos de aula por semana que os alunos das demais regiões do país.”, afirma o estudo.
O investimento alto quando comparado ao PIB pode ser explicado pela falta de dinamismo da economia na região. “Esse dado é um indicador do esforço financeiro feito pelos gestores”, explica Costa. Mas o fato de a região ser relativamente pobre faz com que seu significativamente maior sacrifício (de PIB) não se traduza em um maior gasto por aluno.
Questões extraclasse
Os autores fazem a ressalva de que o nível de investimento não é o único elemento a afetar a aprendizagem dos estudantes. Questões socioeconômicas, como a renda e a escolaridade dos pais, tendem a refletir no desempenho educacional. A análise leva em conta esses aspectos ao incorporar um indicador chamado Indicador de Nível Socioeconômico — INSE. O INSE foi pensado com o objetivo de contextualizar resultados obtidos em avaliações da educação básica. Ele leva em conta fatores como renda familiar, nível educacional e ocupação dos pais.
Mesmo na comparação com regiões de INSE semelhante, a Amazônia fica para trás. Por um lado, esse achado ressalta a importância dos gastos por aluno: o gasto menor parece explicar o pior desempenho dos estudantes da Amazônia, mesmo quando comparado ao de estudantes que vivem em condições socioeconômicas similares.
Mas ele também aponta, destacam os pesquisadores, para questões “idiossincráticas” da região. “Percebemos que, para todos os níveis de gasto, o desempenho da Amazônia no Ideb continua inferior ao do restante do país”, diz da Costa. A diferença média é de 0.155 ponto a menos no IDEB da Amazônia nos anos finais do ensino fundamental, e de 0.52 ponto a menos nos anos iniciais. As razões para isso não estão perfeitamente claras. Os
pesquisadores notaram, no entanto, que existe um descasamento entre a formação dos professores — seu diploma — e as aulas ministradas, o que pode contribuir para esse resultado: “O que observamos na Amazônia Legal é que, quanto maiores os gastos, menor a adequação dos diplomas às aulas ministradas”, aponta o estudo.
Autores: Carlos Eugênio E. L. da Costa; Valdemar Pinho Neto; Marcos Paulo F. Duarte
Digital Object Identifier (DOI): http://doi.org/10.59346/report.amazonia2030.202201.ed27